ANUNCIANTES

2 anos sem festejos juninos em Jaguarari: historiador jaguarariense fala das origens dos festejos juninos, devoção ao padroeiro e defende “Preservar uma tradição é também abrir possibilidades para a renovação”

*Historiador jaguarariense Marcos Araújo 

Em 2021, a população nordestina vivencia mais um ano sem os festejos juninos, fato de bastante comoção, principalmente para o povo jaguarariense, que tem São João Batista como padroeiro, mas que em virtude da pandemia do novo coronavírus, já completa dois anos sem São João. 

O jovem historiador Marcos Araújo, graduado em história pela UPE (Universidade de Pernambuco) em conversa com o Portal Jaguarari, analisa os dois anos sem festejos juninos como bastante significativos para as transformações na própria dinâmica cultural que envolve o ciclo de festas: “Os festejos nunca deixaram de se reinventar”, afirma Marcos. 

Uma festa do campo e da cidade 

“O São João incialmente teve sua história iniciada no Brasil, no período colonial, e antes mesmo de atingir o viés econômico e cultural que possui hoje, era uma festa urbana, ligada ao âmbito religioso. As pessoas preparavam-se para ir as missas na cidade, nas noites de Junho e participar das celebrações realizadas nas Igrejas, após as missas era comum, assistir as apresentações teatrais e danças, além de interagirem socialmente”; esclarece Marcos “Com a vinda de D. João VI ao Brasil, a festa ganhou ainda mais força no território brasileiro. A tradição dos fogos de artifício, os balões e as danças de salão que viriam a ser adaptadas no estilo da Quadrilha, são heranças portuguesas”. 

Sobre o fato do matuto ser figura central nos festejos juninos, além dos próprios santos católicos - Santo Antônio, São João e São Pedro, o historiador afirma: “Com o processo de industrialização no Brasil durantes as décadas de 40/50, as massas do interior migraram para a cidade e expandiram os modos de se fazer a festa. Até mesmo a vestimenta da população do campo, como o chapéu de palha e os remendos nas roupas (para dar aspecto de novo) passaram a ter outra dimensão – o saudosismo ao campo e a preservação de tradições; neste sentido, o ‘ser da roça’ passou a ter outro valor, ainda que essa identidade fosse protagonista nos festejos, mas relegada no restante do ano devido ao preconceito contra aqueles vindos do interior”. 

São João em Jaguarari: Entre a autenticidade e a tradição 

Sobre o São João em Jaguarari, Marcos nos explica que a festa, de certa forma, mostra-nos um sentimento de identificação e promove sociabilidade entre o povo Jaguarariense “Quando João Duarte Cerqueira, no início do século XX (estima-se que em 1900), encomendou a imagem de São João Batista, vinda de Portugal, jamais imaginou o movimento que se viria depois. Mesmo com todo poder aquisitivo e influência que o mesmo tinha por ser funcionário da Guarda Nacional, talvez não imaginasse que as reuniões de sua casa seriam o pontapé de festas grandiosas durante inúmeras gerações” 

Marcos Araújo reforça que a devoção a São João Batista foi se ampliando em Jaguarari, e com o funcionamento da paróquia municipal, teve ainda mais força “As pessoas passaram a se organizar ainda mais, até que o festejo alcançou outros públicos. No período da ditadura Militar, foi incentivado em todo o Brasil, um investimento na relação cultura-economia-turismo, o que fez com que o São João jaguarariense ganhasse importância não só religiosa e cultural, mas econômica – fato que perdura até os dias atuais. É claro que as dinâmicas culturais vão se moldando com o passar do tempo, a festa não é algo estático, que não se molda com o tempo, muito pelo contrário. Novos ritmos musicais, comidas, bebidas e roupas foram sendo aderidos ao ciclo junino, num processo que busca a autenticidade dessa festa, ainda que os elementos tidos como “tradicionais” sejam preservados, como bandeirola, o xadrez, a fogueira, etc.” 

São João e Pandemia: Temos ainda viva a nossa tradição? 

Ao fazermos essa pergunta ao historiador, Marcos foi bem firme ao defender “O são João não é uma tradição intocável aos fluxos culturais. Nenhuma cultura é blindada, todas as manifestações perpassam por transformações ao longo do tempo. Com a pandemia, tivemos que aprender a ficarmos em casa, mas elementos juninos continuaram presentes. Isso começa com o poder público que investe na ornamentação da cidade, nas escolas que virtualmente realizam eventos juninos, ou nas playlists musicais com canções juninas, tocadas continuamente nessa época do ano”. 

“A pandemia afetou a realização do São João em termos presenciais, porém não anulou as simbologias que continuam muito vivas dentro da cultura popular. Foram dois anos difíceis para aqueles mais ansiosos por vivenciar as noites de junho, porém não anula o fato de que preservar uma tradição, é também abrir possibilidades para a renovação. Se temos hoje os nossos festejos nesses moldes, foi porque houve novas adaptações” explica Marcos. 

“Não temos o São João que queríamos, mas ele continua vivo. A pandemia trouxe lives, novas músicas, a novena do padroeiro via rádio, brincadeiras (como challengers, reels, etc). novos sentidos foram incorporados e isso é importante na trajetória cultural desses festejos, são marcos para a história da nossa cidade” finaliza o jovem historiador.

Nenhum comentário