O DEVEDOR DE ALIMENTOS E A NOVA E BENÉFICA PROPOSTA DE PRISÃO CIVIL
*Maraísa Santana
Encontra-se em
vigor, desde o ano de 1973, portanto, a 40 anos, o nosso Código de Processo
Civil (CPC), estando em discussão, atualmente, no Congresso Nacional, projeto
de criação de novo Código para substituir o atual quarentão.
Nesse projeto de
criação de um novo CPC há muitas propostas de mudanças interessantes,
especialmente, aquelas que objetivam dar mais rapidez aos processos civis,
eliminando inúmeros recursos de caráter meramente protelatórios.
No entanto, há
outras propostas de mudanças que têm estimulado fortes polêmicas entre os
doutrinadores especializados na matéria, sendo uma dessas propostas a que
modifica o texto original do PL (Projeto de Lei) 8.046/2010, especificamente,
em seus artigos 514 a 518, que mantinha o texto atual referente à prisão do
devedor de alimentos.
É que no texto do
CPC atual e no texto do PL original, a prisão da dívida alimentar, se
decretada, será cumprida pelo devedor em regime fechado, ainda que tenha o
privilégio de ser recolhido separadamente dos presos comuns.
Segundo a proposta
de mudança, a prisão inicial do devedor de alimentos deixa de ser em regime
fechado e passa para o regime semiaberto, se for punido pela dívida pela primeira
vez, somente sendo decretada a sua prisão em regime fechado se o devedor
persistir na dívida que resultou na primeira prisão.
A justificativa para
a primeira prisão se dar em regime semiaberto é a de que o devedor teria a
chance de trabalhar para cumprir a sua obrigação, ficando livre durante o dia e
somente sendo recolhido à noite.
Para o professor
universitário Ronaldo Batista Pinto, Promotor de Justiça de São Paulo,
comentando o assunto para a Revista Eletrônica Consultor Jurídico, edição de 28.07.2013,
a proposta é equivocada, primeiro, porque entende que nesse caso, a expressão
“regime semiaberto” é má empregada e explica: segundo o art. 33, parágrafo 1º,
alínea “a”, do Código Penal, “regime semiaberto é aquele cujo cumprimento da
pena se dá em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar”.
Logo, se o objetivo
da mudança proposta é a de permitir o trabalho do devedor e com o resultado
desse trabalho cumprir a sua obrigação alimentar, certamente, seria melhor que
se adotasse o regime aberto, já que é por demais conhecida a “carência de
colônias agrícolas, industriais ou similares”, como lembra o promotor paulista,
advertindo que, ainda assim, “não há razões plausíveis que justifiquem essa
inovação”, mesmo porque, na ausência dessa estrutura, o regime semiaberto seria
obrigatoriamente substituído pela prisão domiciliar.
Ora, ora, se o Poder
Público responsável pela fiscalização do cumprimento das penas prisionais não
tem estrutura para cuidar com eficácia dessa tarefa, para quem está cumprindo
penalidades previstas por punição de crimes, como haverá garantia de que esse
Poder Público vai fiscalizar o cumprimento de prisão domiciliar por dívida
alimentar? Seria, portanto, uma penalidade estimuladora da impunidade, aliás,
um dos temas mais debatidos na atualidade, na proposta de Reforma do Código de
Processo Penal, criando um verdadeiro paraíso para os devedores de pensão
alimentícia, na esfera do novo Código de Processo Civil.
Basta notar quão
eficiente é a prisão civil para devedores de pensão alimentícia, de tal sorte
que o dinheiro inexistente para cumprir a obrigação com regularidade, sempre
aparece como num milagre, com a ajuda solidária de parentes e até amigos,
acabando, inclusive, com a arrogância de alguns devedores que costumam desafiar
a justiça, com blefes do tipo “não tem justiça que me faça pagar”, ou “quero
ver quem é o juiz que vai me fazer pagar a pensão alimentícia”, ou, ainda,
“prefiro ficar preso a ter que pagar a pensão alimentícia”.
Puro blefe. É só se
ver enjaulado, no regime fechado, ou, antes disso, basta tomar conhecimento do
decreto prisional para o antes arrogante devedor mobilizar “Deus e o Mundo”
para lhe socorrer, emprestando-lhe ou doando-lhe o dinheiro suficiente para
pagar o débito alimentar, sem falar que muitos descem literalmente de sua
arrogância para o mais baixo nível de humilhação, em busca de acordo com a
parte credora, para não se ver encarcerado.
Para o renomado
civilista Yussef Said Cahali, especialista em Direito de Família, na sua
referenciada obra DOS ALIMENTOS (4ª Edição, revista, ampliada e atualizada de
acordo co o novo Código Civil. São Paulo, 2002, p. 1004), a prisão civil em
regime fechado por dívida alimentar “é o único meio eficaz em condições de
remover a recalcitrância de grande número de devedores inadimplentes”.
Na hipótese da
proposta de mudança de regime prisional para o devedor de alimentos prevalecer
no novo CPC, sem dúvida, o grande beneficiado será esse devedor, razão pela
qual deverá ser mantido o ordenamento contido no artigo 733 do CPC atual,
justamente porque vem cumprindo a sua primordial finalidade, que é “garantir a
sobrevivência do alimentado”, como lembra o professor Ronaldo Batista Pinto.
*MARAÍSA
SANTANA é advogada, pós-graduada em Direito Público e Controle Municipal, com
larga experiência em Direito de Família, integrante do Escritório SANTANA
ADVOCACIA, com unidades em Senhor do Bonfim (Ba) e Salvador (Ba).
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